Segundo especialistas, intervir por meio de acompanhamento psicológico nas escolas pode ajudar a identificar sinais de alerta, promover relações saudáveis e combater a origem dos atritos. Salas de aula de escola de São Paulo
Flávio Florido/Secretaria da Educação do Estado de SP
Países como Austrália, Chile, Singapura, Reino Unido, Canadá, Finlândia e Estados Unidos viram nas políticas voltadas à saúde mental um importante pilar na promoção do bem-estar e no combate à violência escolar.
Os dados são de um levantamento realizado pela consultoria Vozes da Educação a pedido da Fundação Lemann, que mapeou medidas adotadas internacionalmente. (Veja mais abaixo)
Com histórico de atentados, esses países — especialmente os EUA, que lidam com uma pandemia de ataques em massa — entenderam que o caminho é estabelecer uma relação saudável entre estudantes, professores e comunidade.
📊 Contexto: No Brasil, episódios recentes, como os ocorridos em Goiás, São Paulo e Santa Catarina, mobilizaram uma discussão nacional sobre quais políticas implementar, como o reforço do apoio psicológico.
🆘 Causas: Isso porque especialistas apontam que bullying, exclusão, conflitos e até desempenho escolar ruim podem servir de motivação para possíveis ataques.
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✅ Benefícios do apoio psicológico: A intervenção nas escolas pode identificar sinais de alerta, intermediar relações mais saudáveis e combater, na origem, problemas que podem, eventualmente, levar a uma retaliação violenta.
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Veja abaixo como cada um destes países tem lidado com a questão.
1 – Austrália
Política: O país possui a “Be You” (Seja Você) e a “Estratégia Nacional de Saúde Mental e Bem-Estar Infantil”, iniciativas nacionais financiadas pelo governo australiano para promover e proteger a saúde mental de crianças e jovens.
Para quem: A Estratégia Nacional apoia crianças do zero aos 12 anos, enquanto a Be You beneficia estudantes da primeira infância aos 18 anos.
Como é aplicada: Além dos estudantes, pais ou responsáveis, as duas medidas australianas envolvem professores e a sociedade como um todo. Na Estratégia Nacional, são desenvolvidos programas que asseguram que crianças e adolescentes tenham oportunidades de crescimento. Já na Be You, são trabalhadas parcerias com as famílias, identificação e suporte aos primeiros sinais de problema na saúde mental, além de haver reforço na presença de profissionais da saúde na escola.
Fatores de sucesso: orçamento específico direcionado ao programa, a intersetorialidade na atuação, a intervenção precoce e o envolvimento da sociedade.
Essa é uma medida que pode ser muito bem sucedida na Austrália. Já está implantada em mais de 70% do país e há investimento constante para sua manutenção. No Brasil, seria mais complexo, já que nossa população é consideravelmente maior, mas não seria impossível
O especialista também destaca a importância do Programa Nacional de Apoio à Saúde Mental Infanto-Juvenil, também na Austrália, criado especialmente para unificar as iniciativas de saúde mental e uniformizar a atuação eficiente nesta frente.
2 – Canadá
Política: O país conta com medidas regionais como o “School Mental Health Ontario” (Saúde Mental Escolar de Ontário) e o “Children’s Mental Health Ontario” (Saúde Mental das Crianças de Ontário), que funcionam na província onde fica a capital do país, e o “Mental Health in Schools Strategy – British Columbia” (Saúde mental em Estratégia Escolar na Columbia Britânica).
Para quem: As iniciativas atendem crianças e jovens, da pré-escola ao ensino médio.
Como é aplicada: Nos três casos, as medidas atingem a comunidade escolar – alunos, pais e professores – com recursos, ferramentas e formações para escolas, a fim de promover saúde mental aos alunos, e atuando como estratégia de combate ao bullying, para garantir uma convivência mais saudável no ambiente escolar.
3 – Chile
Política: O “Programa Habilidades para la Vida” (Programa Habilidades para a Vida) existe desde 1998 e é comandado pelo Conselho Nacional de Auxílio Escolar e Bolsas de Estudo.
Para quem: Beneficia estudantes da pré-escola ao ensino médio e envolve alunos, pais e professores.
Como é aplicada: O programa é adotado em regiões de vulnerabilidade econômica e social, com objetivo de melhorar o desempenho escolar, o bem-estar mental e trabalhar habilidades pessoais.
“Não é de estranhar que o Chile tenha sido o país latino-americano mais bem colocado no Programa de Avaliação Internacional de Alunos (PISA) –avaliação de desempenho escolar coordenado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aplicada em países de todo o mundo — em 2018”, diz Samuel Fernandes.
Para ele, o histórico do compromisso com a educação alinhado ao cuidado com a saúde mental dos estudantes deveria ser um exemplo para outros países do continente, como o Brasil.
4 – Estados Unidos
Política: Projeto “Cal-Well”, na Califórnia, “Política de Saúde Mental Escolar”, na Carolina do Norte, e “Iniciativa de Saúde Mental”, de Wisconsin.
Para quem: As três políticas estaduais visam beneficiar alunos da pré-escola ao ensino médio.
Como é aplicada: Os departamentos de educação locais instituíram seus próprios programas a fim de estabelecer a prevenção e promoção da saúde mental, além de identificar casos mais graves e sinais de alerta que precisem de atenção extra de profissionais da psicologia.
Para Ana Eliza Albuquerque, doutora em Educação e defensora da implementação de políticas de saúde no ambiente escolar, as medidas já apontam uma luz, mas estão longe de serem suficientes para reverter a “cultura de violência” que tomou conta dos EUA.
Em um país tão grande como os EUA, é necessário que a nação identifique e compreenda o problema, e passe a combatê-lo de maneira coletiva. Só nos primeiros 3 meses de 2023, havia mais de um ataque em massa por dia no país. E, quando essa violência acontece muitas vezes dentro da escola, é fundamental olhar para políticas de prevenção.
5 – Finlândia
Crianças em escola na Finlândia, em 2018
Reprodução Globo Repórter
Política: Uma lei de 2014 determina a garantia do bem-estar de estudantes, com foco na saúde física e mental.
Para quem: Válida para estudantes da educação infantil ao ensino superior.
Como é aplicada: A legislação determina que o governo garanta o bem-estar dos estudantes, criando sistemas de apoio psicológico na escola, além de ter um currículo escolar que discuta temas sobre saúde física e mental. A lei também tornou obrigatória a presença de times de saúde nas escolas do país.
“No Brasil, temos o Artigo 196 da Constituição Federal, que diz que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Apesar de termos um sistema público de saúde, ainda enfrentamos falta de profissionais. Muitos não conseguem ser atendidos por um clínico geral, que dirá por psicólogo. Ainda há muito a ser feito”, considera Samuel Fernandes
6 – Reino Unido
Política: O Reino Unido estabeleceu a “Política de Saúde Mental e Bem-estar em escolas e universidades” em 2020.
Para quem: Alunos e professores das redes de ensino.
Como é aplicada: O Ministério da Educação do Reino Unido estruturou a política com foco na pandemia e retorno às aulas, para alunos e professores da rede de ensino dos países do grupo. Entre outras coisas, a política possibilita atendimentos psicológicos e acompanhamento psicoterapêutico nas escolas.
7 – Singapura
Política: O governo de Singapura investiu no “Youth mental well-being network” (Rede de Bem-Estar Mental para Jovens).
Para quem: Crianças e adolescentes do país.
Como é aplicada: Em um trabalho colaborativo, a iniciativa reúne uma rede de apoio formada por diversos setores governamentais e da sociedade para trabalhar e fortalecer aspectos da saúde mental e do convívio social e familiar dos alunos. Apesar no foco em estudantes, a rede conta com apoio de pais, cuidadores e profissionais da saúde e do setor social.
O projeto ganhou forma e força durante a pandemia, buscando trabalhar resiliência e bem-estar como partes importantes da saúde e do desenvolvimento geral dos jovens, tentando minimizar os efeitos do isolamento imposto pela Covid-19.
“Apesar de ser uma iniciativa mais voltada para uma convivência saudável na escola, para melhorar o desempenho escolar e otimizar as relações, são justamente estes pontos que podem reduzir as chances de um estudante virar um potencial agressor. É preciso louvar essas iniciativas e discutir, afinal, como podemos trazer isso para a realidade do nosso país”, avalia Samuel Fernandes.
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